Irão, Médio Oriente

IRÃO | Mochilando pela antiga Pérsia | Parte 1

O Irão surgiu-nos de uma forma tão oportuna quanto inesperada. Em 2014 estávamos a precisar de um “twist” na nossa vida, e o Irão apareceu-nos à frente, sem reservas, nós aproveitámos e mergulhámos a fundo.

Nunca hesitámos no destino e sequer pensámos em desistir do plano mesmo quando ouvíamos da boca de alguns familiares e amigos, a pergunta clássica: “Mas o Irão não é perigoso ?Não está em guerra?”- Calmamente lá tentávamos explicar que não, e que até é um dos países mais seguros e hospitaleiros do mundo!

Começámos a nossa aventura com uma escala de quase 24 horas em Istambul. Aproveitámos a ocasião e conhecemos um pouco esta cidade que achámos fabulosa. Depois, apanhámos um voo doméstico na Turkish airlines até ao aeroporto de Agri (um dos mais próximos da fronteira turco-iraniana Gurbulak-Bazargan) e daqui seguimos de autocarro até à Pérsia e atravessámos a fronteira a pé.

– AGRI (TURQUIA)-MAKU (IRÃO)

Tudo muito tranquilo. Aterrámos no pequeno aeroporto de Agri, que fica isolado no meio das vastas planícies do Curdistão Turco. Já à saída do terminal, alguns mini-bus para destinos diferentes aguardavam os passageiros. Como não tínhamos bem a certeza como funcionava o transporte, dissemos logo que queríamos ir para o Irão. De imediato indicaram-nos o mini bus correcto e em 30min arrancámos rumo a Dogubeyazit e daqui outro nos levaria até à fronteira. Pelo caminho avistámos algumas tendas da ONU -supostamente de refugiados sírios- e o Monte Ararat que faz fronteira com a Arménia e onde se diz que a embarcação de Noé terá encalhado no final do grande dilúvio.

Chegámos à fronteira ao início da tarde, tudo aconteceu de uma forma bem fluída, sem percalços. Como estava com calções acima do joelho, teria de mudar para calças, então, ainda antes de entrar na parte iraniana fui a uma casa de banho da fronteira e troquei, foi o que deu mais trabalho diga-se. No resto, e como não há muitos viajantes a entrar no Irão por aqui, as tropas iranianas e polícia foram de uma simpatia e hospitalidade incríveis. Muitos “welcome to Iran”, “want do you want to visit?”, “Please don’t miss Esfahan, Shiraz…” etc.

Ficaram tão alegres de nos ter visto por ali, que –ao contrário de todos os outros transeuntes-  nem sequer as nossas malas revistaram ou as passaram no raio-x. “Please, go, go, welcome to Iran”. Era oficial, estávamos num dos países mais temidos do mundo…;-)

Entrada da fronteira do lado iraniano

Saindo e já todas as formalidades cumpridas, vários taxistas aguardam os passageiros. Não houve pressão. Que alívio. Escolhemos logo o primeiro, nem sequer discutimos preço. Perto de 5€ os dois para fazer 25km, pareceu-nos justo, e bom… lá fomos nós em direcção à primeira cidade iraniana, essa desconhecida MAKU.

– MAKU

Centro de Maku

Parecia-mos uns tolinhos a olhar para todo o lado. Na cabeça pairava sempre o pensamento: “Estamos no Irão, estamos no Irão…Carla cuidado com o lenço, será que está alguém a olhar?”- Maçaricos… A verdade é que olhavam, sim, mas para nos oferecerem chá ou perguntar de onde éramos e dizer “welcome to Iran”.

Maku é apenas uma cidade fronteiriça enfiada no meio de um desfiladeiro de montanhas rochosas. Muita gente de passagem. Ainda assim, e devido à hora optámos por ficar aqui uma noite.

Arranjámos quarto duplo no hotel ALVAND, bem no centro da cidade por 8€, jantámos “falaffel”por 4€ -bebida incluída– e procurámos saber informações para o dia seguinte partir para Tabriz, essa sim, a primeira grande cidade iraniana. Perfeito.

– MAKU-TABRIZ

O dia não poderia ter começado da melhor forma. Acordámos cedo pois tínhamos receio de perder o transporte. Já sabendo onde era a estação de autocarros e onde poderíamos adquirir o bilhete MAKU-TABRIZ, somos recebidos pela funcionária do estabelecimento onde o comprámos, com um pequeno almoço, totalmente grátis!! “Welcome to Iran”. Que dizem ?

O nosso pequeno almoço…na agência de viagens

Ainda não eram 10h da manhã quando partimos para Tabriz e ficámos a saber que os condutores dos autocarros no Irão, bebem muuuuuuito chá enquanto conduzem, ao mesmo tempo podem fumar e falar ao telemóvel. Mas isso vai depender da destreza de cada um.

– TABRIZ

Tínhamos chegado já ao final da tarde a esta cidade situada na província iraniana do Azerbeijão Ocidental. O autocarro parou perto do centro. A ideia era procurar primeiro dormida e depois ir até um dos maiores bazares cobertos do mundo, e um dos mais importantes na Rota da seda. Assim foi. Pegámos um táxi e fomos a um dos locais do Irão PATRIMÓNIO UNESCO. Corredores, passagens, ourivesarias, túneis, mais ourivesarias, roupa, fruta, legumes, mais fruta, frutos secos,móveis, decoração, artigos de cozinha…tudo! Literalmente perdidos. “Não importa, alguém nos irá ajudar a sair daqui.

Outro local de bastante interesse nesta cidade é a Mesquita azul ou Kabud Mosque -que significa, coberta de azulejos. Antes da viagem, num blog amigo que costumamos consultar  viajar entre viagens – já tinha lido um artigo sobre este monumento e tínhamos achado muito bonito, então, sem dúvida que estando aqui queríamos visitar.

Na realidade a mesquita de azul já tem muito pouco, a maior parte dos seus azulejos em tons de azul que a cobriam praticamente toda desapareceram com um violento sismo no séc.XVII, assim como quase todo o resto do edifício. Foi já nos anos 70 do século XX que foi reconstruída. No exterior da mesquita há um jardim e adorámos ver muitas crianças a jogar futebol, casais namorando -dentro das regras- e jovens aproveitando o bom tempo para estudar.

O melhor estaria reservado para  noite com um roteiro grátis de táxi pelas ruas de Tabriz, acompanhados de dois curiosos jovens entusiasmadíssimos por estarem com dois estrangeiros, e poderem mostrar a sua cidade, além das milhões de perguntas que nos fizeram acerca de como eram as coisas no nosso país.

No final acabámos todos a comer um gelado -pago pelo taxista- no maior jardim da cidade. É assim no Irão.

– TABRIZ-SANANDAJ 

Ok. O Irão não é um destino muito turístico, mas tem crescido substancialmente o número de visitantes desde 2015. Mas quando se fala em viajar pelo Curdistão Iraniano aí a coisa muda de figura. E foi por isso mesmo que imediatamente decidimos que poderíamos abdicar de ir a outro lugar ou cidade mas abdicar de visitar o Curdistão, nem pensar!

Paisagem do Curdistão Iraniano

A região está na maior parte das  vezes fora dos roteiros da “malta” o que é uma pena, pois a região é lindíssima com montanhas, zonas verdes e lagos, mas o que se destaca no meio disto tudo são as pessoas. Sim, aqui AINDA SÃO MAIS HOSPITALEIRAS QUE NO RESTO DO PAÍS.

Durante a viagem de autocarro desde Tabriz conversámos bastante com 3 pessoas que vinham em nosso redor. Éramos os únicos estrangeiros por ali.  A primeira pergunta desbloqueadora de conversa partiu deles e foi: “what a hell are you doing here?”- Nós respondemos que a região era muito bonita e queríamos visitar. Foi muito curioso Depois as conversas foram-se encadeando e falámos de tudo um pouco, futebol, música, trabalho e …política. Criticaram bastante o governo. Em voz alta. Sem rodeios.

À chegada a Sanandaj -a capital da região- subitamente começaram a discutir uns com os outros. Demorámos a perceber o motivo que os levava a bracejar, apontar para nós e falarem alto. Mas fez-se luz. Discutiam a quem seria dada a honra de nos levarem a fazer uma visita pela cidade, levarem-nos ao hotel ou mesmo ser recebidos nas suas casas. Sim, acreditem. 

Como a discussão estava a demorar, diplomaticamente tomámos uma decisão dura mas justa. Não fomos com nenhum deles, optámos apenas que nos indicassem um hotel bom para dormir, torceram o nariz mas aceitaram. E pronto, lá fomos nós com 3 guias pelas ruas de Sanandaj à procura de um hotel!

Homem curdo com vestes tradicionais da região e do povo curdo

– SANANDAJ

Como já tínhamos umas quantas longas viagens seguidas de autocarro, o cansaço já se fazia sentir. Decidimos então passar o dia devagarinho a percorrer as ruas da capital curda. Sem pressas. Sem querer ver nada em concreto. Apenas vaguear e descobrir o que aparecesse. Destacamos a visita à muito interessante -e diferente- mesquita principal de Sanandaj. Depois de almoço, queríamos resolver -e resolvemos- um problemazito com um dos nossos telemóveis e acabámos a jantar na casa do rapaz que nos atendeu, acompanhados da sua família. Pode ler mais sobre esta história AQUI.

– SANANDAJ- PALANGAN-KERMANSHAH (BISOTUN)

Neste dia o calor era abrasador. Ainda assim, não desistimos da ideia de visitar uma aldeia nas montanhas do Curdistão já perto da fronteira com o Iraque. Não encontrámos autocarro, ou mini-bus, então a solução foi apanhar um táxi partilhado que nos levou até à cidade de Kamyaran, a 75km, e daqui se não houvesse nenhum mini-bus teríamos de contratar os serviços de um táxi privado no percurso de 50km até Palangan. 

E assim teve de ser, a troco de uns modestos 10€ , levou-nos à aldeia, esperou 40min e não só nos levou de volta a Kamyaran mas levou-nos até Kermanshah, cidade onde nos arredores está situada a “área protegida de Bisotun”- Património UNESCO.

Chegámos perto do meio dia. O calor tornou-se mesmo insuportável pelo que não conseguimos mesmo permanecer muito tempo, o que foi uma pena. Alguns moradores abordaram-nos e convidaram-nos para água e chá. Acreditamos que com outra disponibilidade teríamos sido convidados a passar aqui a noite, tendo uma autêntica experiência curda. Fica para a próxima…

VISITA À AREA PROTEGIDA DE BISOTUN-Kermanshah

Está localizada cerca de 30km da cidade e ao longo de uma das principais rotas comerciais que ligavam a antiga Pérsia com a Mesopotâmia. É uma impressionante montanha rochosa recheada de inscrições efectuadas nos vários períodos da história Persa.

Baixo relevo de Darius I

A inscrição considerada pelos arqueólogos e historiadores como a mais importante, é o baixo relevo com escrita cuneiforme mandada executar por Dario I-O Grande aquando da sua ascensão ao trono em 521 a.c. Em volta e debaixo do baixo relevo propriamente dito, há inscrições com milhares de linhas e relatam a história dos feitos em batalhas de Dario. Está tudo relatado em três línguas: Elamita, babilónio e persa antigo.

Está inscrito como Património UNESCO desde 2006 e por tudo isto achámos iríamos gostar de visitar este lugar. O sítio está bem sinalizado, tem boas infraestruturas de apoio ao visitante e muitas famílias vão ali fazer os seus pic-nics.

Chega-se aqui facilmente de min-bus/autocarro desde à estação de autocarros de Kermanshah, na volta também quase todos fazem paragem aqui. Se não quiser aguardar por um transporte público pode perfeitamente negociar um táxi. 

Família iraniana fazendo um pic-nic em Bisotun

– KERMANSHAH-CHOQA ZANBIL-SHIRAZ

Viagem nocturna. Abdicámos de dormir em alojamento para poder rentabilizar melhor o tempo. Compensaríamos depois em Shiraz permanecendo aqui alguns dias. O nosso foco era visitar o ziggurat de Choqa Zanbil.

Foi uma longa e atribulada viagem, o autocarro avariou e a meio da madrugada e era ver os passageiros a ajudarem o motorista a resolver o problema. A verdade é que não sei como, resultou, e 2horas depois da avaria estávamos de novo a rolar, com o condutor impregnado em gasóleo…mas feliz.

Por volta das 5h30 da manhã chegamos a Ahvaza capital da província do Cuzistão- uma das cidades mais quentes do mundo e também das mais poluídas…o número de refinarias de petróleo é enorme, assim como estações de gás. O cheiro a combustíveis, misturado com aquele calor foi algo surreal.

Era noite ainda, e os termómetros exteriores marcavam 45º. Pensei que estivessem avariados, mas quando saímos porta fora do autocarro foi um choque. Parecíamos que tínhamos entrado num forno.

Seja como for, nunca desistimos. Chamámos um táxi, ajustámos um preço e lá fomos visitar Choqa Zanbil , a antiga capital do reino elamita, fundada 1250 a.c que conserva um dos zigurates templos antigos construídos pelos sumérios, babilónios e assírios– mais bem preservados do mundo.

Zigurate de Choqa Zanbil

Obviamente não havia ninguém, apenas o guarda do complexo. Demorámos o que quisemos, mas sobretudo o que pudemos. Foi sobretudo impressionante poder ver de perto e até tocar, os tijolos com escrita elamita, uma das mais antigas formas de escrita do mundo!

Escrita elamita

Todavia o entusiasmo perante a importância do lugar, o calor estava a ser sufocante e o pensamento começou significativamente a ser perturbado. Ainda não eram 8h e já estávamos de regresso a Ahvaz para seguir viagem em direcção a Shiraz, cidade pelo qual nos enamorámos.  

Como a viagem foi extensa decidi partir o artigo em dois, pelo que a PARTE 2 do nosso MOCHILANDO PELA ANTIGA PÉRSIA segue dentro de momentos!

Boas viagens!!

6 Comments

  • Reply

    Rui Quinta

    1 Março, 2018

    Sem dúvida um dos países que mais quero visitar e este artigo vai já para os meus favoritos!
    Eu tinha a ideia que para visitar o Irão era necessário ter um pacote com uma agência. Não há problema nenhum em visitar assim completamente “livre”?

    Rui Quinta, Rui de Viagem

    • Reply

      projecto100rota

      1 Março, 2018

      Olá Rui, não há problema algum, o visto não é difícil de tratar e visitá-lo de forma independente até uma mais valia pois assim tem pmais possibiliddes de ter contacto directo com o povo que no Irão é extremamente hospitaleiro, abraço e obrigado pelo comentário! Disponha sempre!

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    António Cruz

    17 Março, 2018

    Viva! Antes de mais parabéns pelo excelente trabalho! Descobri a pouco tempo mas já estou fã !!!
    Contacto-o porque penso ir em breve ao Irão e gostaria de saber que rota aconselharia para quem vai apenas 8/10 dias, aterrando em Teerão, com direito a visita ao deserto… Como são poucos dias, pensei contratar um guia/motorista para rentabilizar ao máximo. Parece-lhe uma boa opção? Por acaso teria o contacto de alguém? Já agora se me permite, penso tirar o visto no aeroporto, poderei ter algum problema com essa opção? Desde já obrigado e aguardo as suas sugestões! Um abraço e continue com o excelente trabalho!

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      projecto100rota

      18 Março, 2018

      Viva António, muito obrigado pelas suas palavras. Diga-me, quando parte para o Irão ?

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    António Cruz

    18 Março, 2018

    Olá! Ainda não tenho data exata mas penso que será entre finais de maio e meados de Junho. Obrigado:

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      projecto100rota

      19 Março, 2018

      Bom dia António, muito bem, envie-me um email para Franxico_trompista@hotmail.com e poderei fazer-lhe um esboço daquilo que faria caso tivesse esses dias e essa disponibilidade. Abraço!

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